Tecnologia simples é adotada por pequenos agricultores em São Paulo. Além de proteger a saúde, o resíduo pode ser aproveitado como adubo.
O som de uma descarga é tão comum no dia-a-dia de uma casa que muitas vezes a gente nem se dá conta dos destinos dos dejetos. Você sabe para onde segue o encanamento do esgoto numa pequena propriedade rural?
Muitas vezes, a não mais do que 30, 40 metros do banheiro, a chamada fossa negra – que nada mais é do que um buraco na terra – recebe todo o material, sem nenhum tratamento.
O acesso ao lugar é quase proibido, como conta José Amarante, técnico em desenvolvimento agrário do Instituto de Terras do Estado de São Paulo, o Itesp. “Os próprios produtores rurais consideram o local da fossa negra um local perigoso, onde eles orientam as crianças a não chegarem perto, com medo da contaminação. Quando tem visitas numa propriedade rural, o primeiro alerta que o produtor faz é para não chegarem perto da fossa negra, também por conta do perigo de cair”.
Para o buraco não ficar exposto, os produtores improvisam uma cobertura com pau, e folha de zinco. O fato dos dejetos irem direto para o solo compromete a qualidade de vida população. O veterinário Luiz Augusto do Amaral, professor da Unesp de Jaboticabal, trabalha com saúde pública há 30 anos e diz que 80% dos leitos hospitalares são ocupados por pessoas que estão doentes em decorrência da falta de saneamento.
“Quando se investe um dólar em saneamento, se economiza quatro em saúde. E a área rural é onde se produz água, então tudo que for feito para preservar ou impedir sua contaminação, seja superficial ou subterrânea, protege inclusive populações distantes. Quem tem uma fossa negra, tem cinco vezes mais chance de ter sua água contaminada, do que aquele que tem uma fossa correta”, alerta.
Mapa (Foto: Arte G1)
Uma fossa correta como diz o professor, pode ser uma estrutura simples, como a que mudou a saúde das 47 famílias do assentamento Córrego Rico, em Jaboticabal, no norte paulista. Antes desse tipo de construção, os moradores viviam numa situação complicada. A agricultora Tânia Baldão, moradora do assentamento, afirma que as crianças ficavam doentes constantemente. Por conta do programa estadual de microbacias, não existe mais fossa negra no local. “Melhorou muito a saúde”, afirma Nerilde Aparecida dos Santos, assentada.
A notícia sobre os benefícios se espalhou e, mesmo com o fim da verba pública para esse tipo de construção, agricultores tiram dinheiro do próprio bolso para ter a sua fossa séptica, no modelo desenvolvido pela Embrapa.
É caso dos assentados em Ibitiúva, no município de Pitangueiras, a 50 quilômetros de Jaboticabal. Na propriedade de Jaime Fagundes dos Santos, o trabalho conta com a experiência do agricultor Oscar Dias da Silva, que fez 47 das 66 fossas construídas na região sob coordenação do Itesp. “Em vinte, trinta dias a fossa está pronta para funcionar. Eu gosto do trabalho, porque isso é para o futuro. Se as pessoas não cuidarem, o planeta acaba. Então a gente tem que lutar para isso”, afirma.
Sheilla Bolonhezi Verdade é bióloga da Coordenadoria de Assistência Técnica Integral, a Cati, e acompanha o trabalho de saneamento rural nos assentamentos da região. Um kit de três caixas ilustra o funcionamento da fossa séptica, no modelo desenvolvido pela Embrapa. “Como o esgoto entra diretamente no cano, temos uma válvula de retenção que permite que o dejeto entre e ela feche para evitar o refluxo ou o retorno para a tubulação. Conforme vai enchendo, o material vai passando de uma caixa para outra. Lembrando que entre as conexão das caixas tem sempre uma válvula de inspeção. No caso de um problema de entupimento, não necessariamente precisa abrir as duas caixas”, explica.
Por conta da fermentação dos dejetos é importante que as tampas das duas primeiras caixas tenham uma válvula de escape. Uma perfuração facilita a saída do gás produzido do processo de biodigestão.
Estrutura da fossa séptica composta por três caixas (Foto: TV Globo)
Estrutura da fossa séptica (Foto: TV Globo)
Na estrutura da fossa séptica, composta por três caixas, a primeira dá início à fermentação dos dejetos, processo que vai decompor o material e eliminar a maior dos causadores de doenças. Conforme vai enchendo, o líquido passa para a segunda caixa, que completa a fermentação até chegar à terceira.
“A terceira caixa já está com o efluente livre de patógenos. O líquido pode ser utilizado para irrigação de culturas. Não é indicado no uso de hortaliças, de folhas, de consumo direto. O produtor vai gastar aproximadamente de mil a mil e duzentos reais para montar essa estrutura, dependendo do material a ser utilizado”, comenta a bióloga. Uma estrutura com três caixas de mil litros cada uma dá conta de atender uma família de cinco pessoas.
Há 12 anos, a primeira fossa séptica, no modelo desenvolvido pela Embrapa, foi instalada em Jaboticabal. Ela serviu de base para que o sistema fosse adotado nas pequenas propriedades da região e continua funcionamento perfeitamente. A iniciativa foi do médico e agricultor Aleudo Coelho Santana, que buscava uma alternativa para substituir as fossas negras da sua fazenda.
A fossa séptica deve ser instalada a uma distância de pelo menos 30 metros da casa e longe de onde se faz a captação da água. Hoje, Aleudo tem seis fossas sépticas na propriedade, uma para cada residência de funcionário.
“Ela só coleta o que vem do vaso sanitário. A água de chuveiro ou de pia, que teria sabão ou sabonete, inibiria a flora, que é necessária à biodigestão, ou seja, mataria as bactérias”, explica.
Aleudo optou por ter quatro reservatórios. Nos dois primeiros é onde ocorre a biodigestão. Os outros servem de estoque do efluente, o adubo líquido produzido durante o processo. “Aqui o investimento é em meio ambiente. Da descarga do banheiro até o produto ficar pronto para ser levado para o campo, leva mais ou menos trinta dias”, afirma.
Para facilitar o manejo, Aleudo acoplou um cano na última caixa da fossa. Basta abrir um registro que o líquido desce por gravidade até o tanque que vai levar o adubo para suas lavouras.
Para desativar uma fossa negra, o Itesp e a Cati têm recomendado o uso de cal. Depois, é fechar o buraco com terra. Num prazo de 30 a 60 dias, essa fossa negra desativada deixará de poluir o solo com verme, bactéria e protozoário.
Para mais informações sobre a construção de fossas sépticas, escreva para a Coordenadoria de Assistência Técnica Integral.
Fossa séptica protege o solo e a água da contaminação
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