A ansiedade pela espera, por décadas, do tratamento de esgoto urbano em Bauru será da mesma proporção que o desafio do município em regularizar e interromper o despejo irregular de graxa, tinta, óleo, sabão e detergentes na rede, impedindo que a Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) receba produtos que afetam sua produção e concorrem contra o programa de saneamento que, somente na unidade principal, no Distrito Industrial, vai consumir mais de R$ 130 milhões nesta fase do projeto.
O desafio de regulamentar, regularizar, fiscalizar e impedir o despejo já é conhecido do governo municipal desde a fase de contratação do projeto básico. Um grupo de trabalho coordenado por técnicos do Departamento de Água e Esgoto (DAE) discute as etapas desde 2008. Mas o abismo entre as exigências e a cultura dos cidadãos no uso da rede é uma realidade que, agora, não pode mais ser adiada.
No DAE, que assume a coordenação do programa de tratamento de esgoto por afinidade natural de atuação, a diretora do Serviço de Tratamento de Esgoto, Giselda Passos Giafferris, aponta o tripé da ação de implantação nesta fase: lei, cadastro e fiscalização. “O grupo de estudos do programa de tratamento está submetendo a minuta do regime de tratamento para indústria, comércio e residências ao sistema tarifário, que precisa ser definido. Isso está na Diretoria Financeira. A lei que define a regulação e regulamentação do sistema estará em condições de ir para a Câmara no início do próximo ano”, diz.
A conclusão da instalação da ETE do Distrito Industrial, com capacidade para receber e tratar 435 litros por segundo de resíduos, está programada para novembro de 2016 em seus três primeiros módulos. Este é o prazo final estabelecido junto ao Ministério Público Estadual (MPE).
“O Grupo Gestor foi constituído em 2008. A fase de caracterização de esgoto indicou o que chega à rede. Estamos definindo a legislação que prevê o funcionamento desse sistema. Definidas as regras, a cidade tem de estar preparada para mudar sua cultura de comportamento, do resto de comida e óleo que é despejado na pia hoje ao restaurante que não recolhe alimentos, à unidade industrial que não tem tratamento próprio e terá de se adequar para enviar isso à estação”, descreve.
Segundo a diretora, que também é formada em química, não há alarde quanto ao despejo industrial. “A caracterização aponta o que se esperava, com apontamentos de itens ligados à indústria plástica, metalúrgica, enfim, conforme o perfil esperado. Nada que prejudique o funcionamento da estação de tratamento. A preocupação agora é definir a lei, o tarifário, o cadastramento e a fiscalização, o que depende da ação de várias secretarias em conjunto”, cita.
Nesse sentido, não há, na visão do Grupo Gestor, uma frente de ação que preocupe mais. “Temos um problema sério em quase toda a cidade com o retorno de esgoto, pelo uso irregular da rede de água pluvial. Isso continua preocupando. Mas também temos a falta de cultura na limpeza de caixa de gordura. Quem tem não limpa e milhares nem tem a caixa. Temos de combater despejo de graxa, uso de solventes e óleo em oficinas, lavacar, posto de gasolina. Mas também temos problemas com entupimento de rede por resto de alimento em áreas onde há concentração de estabelecimentos da área de alimentação. Todas essas frentes precisam ser resolvidas”, elenca Giselda.
A diretora salienta que, no contexto, a implantação da Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) exige que a cidade enfrente a missão de mudar o comportamento de uso do sistema de saneamento. “Se o esgoto retorna na casa é porque há irregularidade no uso da rede de água pluvial. Entupir a rede no Centro e encontramos muito arroz, feijão, pedaço de alface, carne. Então tem estabelecimento jogando isso de foram irregular. Todas essas questões terão de ser resolvidas agora, enfrentadas. Não tem jeito. No retorno de esgoto esse material está indo para o rio, não vai para o interceptor. Então é frustrar o programa de tratamento se não atacar isso. É algo que terá resultado no tempo, mas tem de enfrentar”, insiste a diretora.
A maior preocupação é com o uso irregular da rede de água pluvial, além do volume que gera retorno de esgoto nas casas. “Esse esgoto retorna para dentro das casas e o usuário reclama no DAE, mas o problema está na instalação. Já o uso da galeria acontece em larga escala, em todas as regiões da cidade, e se persistir extrapola a capacidade da Estação de Tratamento. A água em excesso dilui muito o sistema que funciona com microorganismo que ‘come’ o esgoto. O custo operacional fica elevado e a produtividade da ETE é afetada”, menciona Giafferis.
A diretoria do DAE explica que a ETE tem uma proteção logo na entrada do sistema. O funcionamento é automatizado. “Esses produtos que interferem no processo são bloqueados na entrada. O que não é parte integrante do tratamento retorna para o rio após a estação”, esclarece.
Lançamento no rio é mais complicado
Para o prefeito Rodrigo Agostinho, o problema de retorno de esgoto é algo que precisa ser atacado, mas o que mais preocupa são os lançamentos na galeria de água pluvial. “O retorno do esgoto preocupa, mas é problema do dono da casa. O DAE deve atacar isso, mas o maior problema é o esgoto que chega à galeria de água pluvial. E isso significa que mesmo com a rede de interceptores esse esgoto vai continuar caindo no rio. E vai continuar poluindo e ‘fura’ o sistema. A rede de interceptores termina até o final do ano. Se continuar tendo esgoto lançado no rio é desmoralizante”, opina Agostinho.
O prefeito lembra que, nesse caso, o esgoto não será tratado, fica no rio. “A administração investe milhões na rede de interceptores, com o arrecadado dos cidadãos, mas se permanecer o lançamento de esgoto na galeria pluvial o problema não se resolve”, acrescenta.
Sobre a dificuldade na fiscalização, Agostinho acrescenta que a agilização na abertura de empresas implementado pelo Estado, o serviço Via Rápido, trouxe como dificuldade adicional para os negócios de baixo risco ambiental ou de segurança o acesso ao licenciamento de funcionamento sem a realização do crivo sobre ações como o tratamento ou confinamento de poluentes, como gorduras e solventes no caso de oficinas, demais derivados de petróleo no caso de lavacar, assim por diante.
“Só pela Via Rápida permite que as empresas abram suas portas sem que a Seplan consiga impedir o descumprimento de exigências ambientais”, finaliza.