Será que o fato ocorrido em Minas Gerais, na cidade de Mariana, foi um ‘acidente’, uma grande ‘falta de sorte’? Ou o que aconteceu foi um monstruoso crime socioambiental? Uma coisa é certa: sem dúvida está na lista das maiores violências contra a natureza acontecidas no país.
5 de novembro de 2015, uma quinta feira, jamais será esquecida para os habitantes da região de Mariana, espaço de exploração colonial desde o século XVIII, conhecido depois por ‘quadrilátero ferrífero’ e responsável hoje por 60% da produção desse minério para o Brasil. Na tarde daquela data, duas barragens, Fundão e Santarém, localizadas na zona rural, distrito de Bento Rodrigues, se romperam e, então, iniciou-se a inundação da área com lama de rejeitos sólidos, usados no processo de mineração. A presidência da empresa Samarco disse não ter, ainda, certeza do que ocorreu para a tragédia acontecer. A Samarco é a 10ª maior exportadora nacional e produz pelotas, matéria-prima para fabricação de minério de ferro. Foi fundada em 1977 e tem a Vale do Rio Doce com uma participação de 50% no capital por meio de uma joint venture com a BHP Billiton, empresa nº1 de mineração do mundo, criada na fusão da australiana BHP – Broken Hill Proprietary Company, com a inglesa Billiton.
Os responsáveis pela ação emergencial, comentando o acontecido, disseram que, por volta das 14h, houve um tremor e funcionários foram até o local, não verificando nenhuma rachadura. Mas, uma hora depois, a barragem de Fundão se rompeu e causou também o estrago em Santarém. Em poucas horas, os detritos atropelaram o distrito de Bento Rodrigues e Paracatu, depois atingiram Águas Claras, Ponte do Gama, Pedras, a cidade de Barra Longa, rumando ao Espírito Santo. Nega-se erro de cálculo/ análise e afirma-se que tudo será apurado. De imediato foram admitidas 13 mortes e, conforme a Rádio Inconfidência, a presidência da Samarco reiterou que o rejeito de minério de ferro não é tóxico: “as operações nas barragens eram regulares, licenciadas e monitoradas dentro do melhor padrão que a gente conhece de monitoramento”. O secretário de Estado de Desenvolvimento Econômico, Altamir Rôso, originalmente vinculado à construção civil em MG, classificou a Samarco como ‘vítima do rompimento’. Até sexta feira, 13 de novembro, o governo federal já previa multas à empresa na ordem de R$ 300 milhões, por descumprimento de legislação. Também cabe indenização à União, aos estados de Minas Gerais e do Espírito Santo, às prefeituras e às pessoas atingidas.
Para moradores da região, as coisas não são mero infortúnio. O perigo está sempre rondando. D. Paulo Mendes Peixoto, CNBB – Regional Leste, declarou à Agência Brasil/EBC que não é a primeira vez que ocorrem acidentes no Estado envolvendo o setor de mineração. “Pelo menos cinco episódios relacionados a mineradoras ocorreram nos últimos tempos. É necessário mais rigor no setor […] Há pouco tempo visitei uma mineradora e pude ver como os rejeitos são depositados. É muita coisa”. De acordo com o Movimento Nacional pela Soberania Popular Frente à Mineração, o rompimento da barragem “não é um acidente, é um acontecimento de total responsabilidade das empresas”. Há ausência de fiscalização, segundo os ativistas. Conforme a jornalista Laura Capriglione, os habitantes reclamam que nem uma mera sirene existia no local para avisar de emergências aos moradores, algo banal para quem faturou R$ 7,6 bi, com lucro líquido de R$ 2,8 bi/ 2014. Todas as entradas estão fechadas pela polícia e só passa quem estiver autorizado.
A lama poluída chegou ao leito de Rio Doce e, por efeito dominó, as cidades foram suspendendo o abastecimento da água. A devastação é imensa, com número ainda incerto de vítimas humanas e incontáveis animais configurando a tragédia. Um ‘tsunami’ mineiro cujos efeitos colaterais resultam em caos ecológico. São 62 milhões de m3 de sílica, metais pesados e soda caustica. A saber, 1m³ de lama = 1 metro cúbico de lama = 1000 litros de lama. Assim, provocou-se um bloco de lama com altura maior que o Empire State Building / Nova York em forma cúbica: mesmas altura, profundidade e largura, isto é, 396 metros de lados (Fonte: Árvore, Ser Tecnológico).
A Folha publicou matéria alertando que, das 735 barragens existentes em Minas Gerais, 42 não têm garantia de estabilidade, segundo relatório da Fundação Estadual de Meio Ambiente datado de 2014, sendo que em 29 dessas barragens não foi possível garantir a estabilidade e, em 13, não foi finalizada a auditoria por falta de documentos. Pergunta básica: então, por que continuam a funcionar? Apenas para lembrar: o setor de mineração é dos mais influentes na política e peso pesado na economia. A Vale, por exemplo, em 2010, doou para diretórios nacionais partidários R$ 30 milhões, sendo 2/3 distribuídos entre os mais populares PT, PSDB e PMDB, dentro dos financiamentos privados de campanha. Resta, agora, torcer pelo trabalho de bombeiros, defesa civil e ambientalistas na salvação do que restou e que a justiça faça rigorosamente sua parte na apuração de responsabilidades. São Paulo, 13 de novembro de 2015.
Prof. José de Almeida Amaral Júnior
Professor universitário em Ciências Sociais; Economista, pós-graduado em Sociologia e mestre em Políticas de Educação; Colunista do Jornal Mundo Lusíada On Line, do Jornal Cantareira e da Rádio 9 de Julho AM 1600 Khz de São Paulo